Educação

Instituto Semear ajuda alunos carentes em universidades de ponta

A organização oferece, além de auxílio financeiro, um mentor já consagrado na atividade profissional que o estudante pretende atuar

O voluntário Felipe Silveira (esq)
O voluntário Felipe Silveira Instituto Semear
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A maioria dos incentivos financeiros a jovens pobres com bom resultado na escola incorre no mesmo problema. Eles ganham uma bolsa de estudos, cursam a faculdade correndo de prejuízos acumulados por menor capital cultural, deficiências na aprendizagem básica e dificuldade de arcar com custos extras e, quando finalmente conseguem se formar, não são chamados para bons empregos. Lacunas como idiomas, atividades extras e, principalmente, falta de indicação de outros profissionais os mantêm em desvantagem depois de todos os esforços.

O Instituto Semear faz uma ação social diferente para tentar mudar esse final. Criado por pessoas físicas voluntárias do setor de educação, a organização oferece, além de uma bolsa, um mentor. A ideia é colocar o jovem que vem de situação desfavorável em contato com um profissional na cidade em que vai estudar morar para ajudar a dar dicas do que fazer além do curso.

Foi assim que, apenas meses depois de ter vindo de uma família pobre de Olindina, na Bahia, para cursar Direito na Universidade de São Paulo, Abrahan Lincoln, 20 anos, atravessou o Largo de São Francisco, onde fica a famosa instituição, e entrou com um advogado no restaurante mais tradicional da região. Sua companhia era Felipe Silveira, 36 anos, voluntário do programa e profissional bem-sucedido formado ali 10 anos antes.

No almoço, falaram sobre a greve que estava ocorrendo na faculdade naquele dia, o professor que Abrahan admirava, o inglês que Silveira achava primordial o estudante aprender, e amenidades. “Nunca falta assunto”, comentou o advogado, sempre sorrindo quando fala do programa.

Paulistano, Felipe estudou no Colégio Santa Cruz, um dos melhores e mais tradicionais da cidade e sabe que seu capital cultural o ajudou a entrar no mercado de trabalho. Ele conta que nunca havia sido voluntário e estava nervoso com a possibilidade de ser um mentor, mas se surpreendeu com a naturalidade com que se aproximaram. “Temos realidades completamente diferentes, mas é muito bom ajudar alguém que merece tanto e é um aprendizado para eu tentar ver a vida deste ponto de vista”, comenta.

Até o último ano do Ensino Médio, Abrahan Lincoln tinha planos de se mudar para a capital baiana e procurar emprego. “Qualquer emprego”, lembra, contando que em Olindina, cidade de 27 mil habitantes onde a família vive, ter um emprego já é ambição. Por conta do incentivo do pai, vendedor em carro de som e da mãe, que vende salgados em uma escola, ele entrou em um cursinho popular. “Conheci Filosofia e Sociologia e comecei a estudar compulsivamente. Me apaixonei pelo conhecimento”, afirma.

O professor do cursinho percebeu o potencial do adolescente e o incentivou a prestar vestibular. Na primeira tentativa ele conseguiu ser aprovado para a segunda fase na Universidade Federal da Bahia. A partir daí se tornou ajudante do professor e estudou de graça mais dois anos até ser aprovado em 2015 na USP. “Tive ajuda sempre. Um amigo me hospedou para prestar a prova. Depois, quando vim de mudança e procurei a casa do estudante, me falaram do Semear e hoje tenho um amigo em São Paulo. Eu espero poder contribuir com alguém um dia”, comenta.

A retribuição é um dos pilares do projeto. O processo seletivo para jovens pobres que tenham sido admitidos em vestibulares concorridos inclui dinâmica de grupo e observação das ideias de devolução à sociedade que os jovens tenham. “Nossa ideia de transformar a sociedade é trazer quem está na base da pirâmide social para cima e ajuda-lo para que ele busque mais gente de baixo”, afirma André Mathias, fundador.

Ele conta que a ideia do projeto nasceu quando queria contribuir em um projeto de educação e notou que a maioria das ideias dava apenas assistência para ingresso na faculdade. “Atuamos com um público já muito selecionado. Quem ingressa em uma universidade competitiva tendo estudado em escola pública tem um potencial enorme e precisa de ajuda também para terminar”, comenta.

Além da mentoria, os selecionados recebem uma bolsa em dinheiro com valor variável. O total pode chegar a 3 mil reais conforme o custo de vida do local em que passaram a morar e a condição socioeconômica da família. O pagamento é repassado a uma conta corrente, começando com um valor mais alto que vai sendo reduzido ao longo do ano. “A ideia é ajudar mais no começo, quando estão precisando comprar mais coisas e também ir incentivando que busquem outras formas de renda”, explica Mathias.

O Instituto tem unidades em São Paulo, Fortaleza e São José dos Campos e conta com cem doares, além de parcerias com empresas que auxiliam no processo, como LinkedIn e Fundação Beto Studart. Abrahan usou o dinheiro para ajudar a comprar um fogão para a casa em que mora em São Paulo, mas acha que o apoio de Silveira terá mais valor. Os dois fizeram turismo pela cidade e se falam por e-mail e mensagem de celular. “Sou um pouco tímido em determinadas situações, saber que uma pessoa voluntariamente quer te apoiar faz a gente saber quem procurar.”

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