Educação

Quais os princípios da Summerhill, a escola democrática mais famosa do mundo?

A partir do desenvolvimento emocional de seus estudantes, a escola democrática incentiva liberdade no percurso formativo

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Na Summerhill ||
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São 97 anos desde a fundação da Summerhill, na Inglaterra, pelo educador escocês Alexander Sutherland Neill (1883-1973) e a escola continua sendo um modelo influente de educação progressista e democrática em todo o mundo. Desde então, são muitas mudanças em curso como afirmou o professor da instituição, Henry Readhead, neto de Neil e também ex-aluno da escola, em encontro promovido no Instituto Singularidades na quarta (29), em São Paulo.

“A escola evolui de acordo com o mundo ao seu redor”, colocou o educador se referindo a como a instituição, a democracia infantil mais antiga do mundo, permanece em diálogo com a realidade dos estudantes e comprometida com a formação deles. “Queremos que eles atinjam seus objetivos, sigam suas paixões. A diferença é que não há compulsão, eles fazem suas escolhas”.

“Aprender é importante. Mas, e ser? Isso deveria ser bem aceito”, provocou Readhead, enfatizando o compromisso da instituição com o desenvolvimento integral de seus estudantes. “Queremos educá-los por completo, não só do pescoço para cima como fazem os sistemas opressivos. Eles não permitem que as crianças aprendam sobre si”.

Durante o evento, o educador elencou quatro aspectos filosóficos que dão base para a Summerhill, desde a sua criação por Neil.

1) Desenvolvimento emocional

Os estudantes são estimulados a entrarem em contato com os seus corpos e suas emoções. Na prática, eles aprendem fazendo, “vivenciando tudo que aprendem”, reforçou o educador. Readhead contou que os estudantes são protagonistas a todo o tempo e participam ativamente da escola, dentro de uma perspectiva democrática. Além de organizarem festas e eventos, eles formulam as regras de convivência da unidade, pactuadas em reuniões que envolvem todo o corpo escolar. Os encontros acontecem três vezes por semana e não são obrigatórios. “Mas 90% das crianças participam”, atestou o educador. “Isso acontece porque elas se apropriam do momento e das leis, já que nao foram adultos que as impuseram”.

Nas reuniões, as crianças também têm a chance de anunciar situações em que um colega da comunidade, criança ou adulto, infringiu algum combinado. Nessas situações, são previstas multas para quem errou, “não numa perspectiva punitivista, mas preventiva, para que ela entenda o porquê da penalidade”, explicou o educador. As multas podem se transformar em tarefas como limpar a escola, pular por 15 minutos, ou ser proibido de utilizar algum brinquedo por um período de tempo. Um ponto importante, segundo Readhead, é que as leis são as mesmas para as crianças e os adultos da escola.

2) Educação individualizada

O percurso de cada estudante é particular e orientado a partir do seu desejo/ambição. “O Estado e a sociedade pregam a todo tempo uma ideia do que é ter sucesso, como ter uma carreira, adquirir um carro, por exemplo. Para nós, sucesso é aquilo que o indivíduo define. Por isso, sempre buscamos saber: qual é sua ambição?”, contou o especialista. A escola, reforçou o educador, não quer impor nada aos estudantes e estimula inclusive as famílias a eliminarem essas expectativas sobre as crianças e adolescentes, por gerarem apenas stress.

3) O brincar livre

“Permitir que as crianças brinquem livremente, essa é a nossa base”, esclareceu o educador Henry Readhead, que afirma que a brincadeira é uma maneira natural das crianças se desenvolverem. “Queremos que elas brinquem por brincar, sem qualquer interferência, apenas pelos seus interesses e curiosidades, porque isso também leva a aprender”.

4) Liberdade sem permissão

Na escola, os alunos são livres para fazer o que quiserem, “desde que não interfiram no direito dos outros”, colocou o professor. Nessa perspectiva também ficam de fora as hierarquias, “todos conversam de igual para igual na escola”, afirma o educador. Outra questão é que os alunos são incentivados à autogovernança, ou seja, têm liberdade para se organizarem entre si.

Como é a dinâmica da Summerhill?

A Summerhill possui um currículo estruturado com disciplinas e também se insere na lógica de exames educacionais para que os estudantes possam concorrer a vestibulares. O que muda é que nada é obrigatório na escola, nem as aulas, nem as provas e exames. O percurso é dado de acordo com a intenção do estudante.

As aulas começam às 9h da manhã e terminam entre as 15 e as 17 horas, dependendo do dia. Depois disso, há tempo livre para os estudantes fazerem o que quiserem, como brincar, jogar ou ver TV.

Vista das dependências da escola. Créditos: divulgação

A escola atende dos cinco aos dezoito anos de idade e prevê um tipo de apoio para cada fase do desenvolvimento. Na classe 1, dos cinco aos dez anos, os professores apoiam os estudantes a organizarem as atividades da semana, oferecidas em espaços multi-atividades. Na classse 2, dos 10 aos 13 anos, prevalece uma lógica de inscrição dos alunos em atividades e projetos que tenham interesse, no início do ano letivo. Na classe 3, dos 13 aos 14 anos, a escola incentiva os estudantes a conversarem com os professores para que entendam o que está previsto. “Incentivamos que eles experimentem ao máximo diferentes matérias”, declarou o professor.

A partir desta idade, os professores atuam mais fortemente como orientadores, buscando entender o que os alunos pensam para além da Summerhill. “Aqui os alunos são mais livres para experimentar, dentro da ideia que o desenvolvimento como ser humano se dá ao longo da vida”, declarou Henry Readhead.

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Não estão descartados os objetivos que os professores devem cumprir com os alunos e eles devem ser cumpridos para que haja a passagem dos estudantes de um ciclo para outro. Em relação aos professores, todos são chefes de seu departamento, o que cria uma grande cultura de apoio entre os educadores.

Quanto à estrutura, são 48 mil metros quadrados de propriedade, com possibilidades de explorações diversas, como acampamentos e escaladas. A escola também conta com um conjunto de casas que abrigam os estudantes por faixa etária. Dos 78, 50 moram nas dependências e outros 28 ficam apenas no período de estudos.

“Queremos que os estudantes não detestem estudar. Em qualquer escolha que fizermos na vida, há partes chatas e é exatamente por isso que a relação emocional dos alunos é muito importante para nós”, finalizou o educador.

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