Educação

Ideia Legislativa quer manter cursos de Humanas nas universidades públicas

Proposta faz frente à iniciativa que quer retirar os cursos de Filosofia, História, Geografia, Sociologia, Artes e Artes Cênicas das instituições públicas

Créditos: Flickr
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Está no ar uma Ideia Legislativa para assegurar a permanência dos cursos de Humanas nas universidades públicas. A proposta, assinada por Acsa da Costa Silva, do Pará, vem fazer frente à outra que busca exatamente o contrário, extinguir os cursos de Filosofia, História, Geografia, Sociologia, Artes e Artes Cênicas das instituições públicas.

A proposta que preza pela retirada alega que, por serem baratos, os cursos podem ser facilmente realizados em estabelecimentos privados, presencialmente ou à distância. O texto ainda coloca que “não é adequado usar dinheiro público e espaço direcionado a esses cursos” dado que o “país precisa de mais médicos e cientistas”.

A ideia em defesa da continuidade dos cursos pode receber apoio até o dia 14 de julho e precisa de no mínimo 20 mil apoios para se tornar uma sugestão legislativa e ser debatida pelos senadores. Até o fechamento da reportagem, a proposta já somava mais de 42 mil apoios.

Em artigo escrito para a Carta Capital, “O descaminho das humanidades”, o jornalista Carlos Drummond refletiu sobre a tentativa de retirar alguns cursos de humanas das universidades públicas. Para ele, a menção à modalidade à distância conecta-se à intenção de o governo liberar a realização de 40% do Ensino Médio na modalidade, “senha para a privatização e o rebaixamento generalizados da educação, impulsionados também pelo Programa Escola Sem Partido, aprovado em alguns municípios”.

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O especialista lembra que as faculdades particulares passariam a ser as ofertantes exclusivas dos cursos extintos nas universidades federais gratuitas, as mais bem avaliadas nos rankings mundiais de qualidade e também deixariam de formar professores e pesquisadores naquelas áreas de conhecimento e de fornecer disciplinas a outras estruturas curriculares.

Em seu artigo, Drummond ainda recorre aos argumentos de alguns pensadores para refletir sobre a importância da área de Humanidades para a formação integral dos indivíduos. Ele retoma a ideia do economista norueguês Erik S. Reinert que defende que a História é o único laboratório disponível para os profissionais do seu ramo. “Sem o aporte desta e de outras matérias de humanidades, será ainda mais difícil evitar o atrelamento completo do ensino aos interesses do setor financeiro”.

Também recorre a Andrew John Mearman, professor da Escola de Negócios Bristol da Universidade West of England, que alega que, “apesar de os currículos da maior parte dos cursos denotarem a concepção de que as habilidades necessárias aos profissionais da área são essencialmente a capacidade de elaborar matemática de alto nível e reproduzir os pontos centrais de determinada linha de pensamento, vários estudiosos reconhecem o caráter essencial do conhecimento de humanidades na solução de problemas complexos que exigem saber econômico combinado à flexibilidade de pensamento, insights de outras disciplinas e consciência da realidade social e política do país e do mundo”.

Drummond ainda cita que “as chamadas humanidades são alicerces da formação de John Maynard Keynes, Alfred Marshall e Celso Furtado, entre muitos outros”. Segundo ele, Furtado, economista brasileiro de projeção internacional, defende que a reflexão sobre a cultura brasileira deveria ser o ponto de partida para o debate sobre as opções de desenvolvimento em oposição à busca de diagnósticos a partir de “montagens conceituais sem raízes em nossa história”.

Para a diretora da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP, Maria Arminda do Nascimento Arruda, a tentativa pela retirada dos cursos é fruto da incompreensão e do retrocesso que hoje ocupa a sociedade brasileira. Arruda chama a atenção para um dos pontos da justificativa: “o entendimento de que os cursos de Humanas não são onerosos e que, portanto, podem ser cursados em instituições privadas, traz a perspectiva de que educação é custo e não um direito”.

Ela também entende que a ideia é a de promover a exclusão absoluta de determinadas áreas. “Aqui, na Faculdade de Filosofia, temos várias habilitações, inclusive cursos de sânscrito e por quê? Porque isso é o legado cultural da humanidade e que ninguém do mercado vai acolher, justamente pela lógica da rentabilidade colocada”, avalia.

A especialista atrela ao “momento regressivo” vivido pelo País a intenção de promover o descarte dos cursos. “O que se pode considerar descartável nesse momento? Tudo aquilo que não atende aos interesses do mercado. E o que pode criar problemas? As disciplinas que têm como centro de sua reflexão a análise do mundo e a construção de uma visão crítica acerca dele”, observa.

E ainda alerta sobre os perigos da proposta. “Se um projeto como esse passa, joga o País nos braços das formas não só autoritárias, mas nas formas subterrâneas mais atrasadas de compreensão do mundo e da vida”, coloca defendendo a existência da área de Humanas enquanto produtora de sentidos e compreensão da vida.

“O mundo contemporâneo, essa sociedade inquietante que valoriza a ciência experimental e a pura tecnologia caminha no sentido oposto dessa lógica. As dimensões da vida ultrapassam a tecnologia e o puro experimentalismo. Há uma dimensão inescapável nisso tudo que é a compreensão da existência. Além do mais, a técnica, deixada em si mesma, sem a sua crítica, produz a barbárie, o nazismo foi isso. Por isso, as dimensões humanas, dimensões éticas e culturais são centrais na sociedade contemporânea”, finaliza.

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